quinta-feira, 23 de abril de 2009

A VERDADE

A VERDADE


Uma donzela estava um dia sentada à beira de um riacho, deixando a água do riacho passar
por entre os seus dedos muito brancos, quando sentiu o seu anel de diamante ser levado pelas águas. Temendo
o castigo do pai, a donzela contou em casa que fora assaltada por um homem no bosque e que ele arrancara o
anel de diamante do seu dedo e a deixara desfalecida sobre um canteiro de margaridas.
O pai e os irmãos da donzela foram atrás do assaltante e encontraram um homem dormindo no
bosque, e o mataram, mas não encontraram o anel de diamante. E a donzela disse:
- Agora me lembro, não era um homem, mas dois.
E o pai e os irmãos da donzela saíram atrás do segundo homem, e o encontraram, e o mataram,
mas ele também não tinha o anel. E a donzela disse:
- Então está com o terceiro!
Pois se lembrara que havia um terceiro assaltante. E o pai e os irmãos da donzela saíram no
encalço do terceiro assaltante, e o encontraram no bosque. Mas não o mataram, pois estavam fartos de sangue.
E trouxeram o homem para a aldeia, e o revistaram, e encontraram no seu bolso o anel de diamante da donzela,
para espanto dela.
- Foi ele que assaltou a donzela, e arrancou o anel de seu dedo e a deixou desfalecida –
gritaram os aldeões.
- Matem-no!
- Esperem!
- gritou o homem, no momento em que passavam a corda da forca pelo seu pescoço.
- Eu não roubei o anel. Foi ela que me deu!
E apontou a donzela, diante do escândalo de todos.
O homem contou que estava sentado à beira do riacho, pescando, quando a donzela se
aproximou e pediu um beijo. Ele deu o beijo. Depois a donzela tirara a roupa e pedira que ele a possuísse, pois
queria saber o que era o amor. Mas como ele era um homem honrado, ele resistira, e dissera que a donzela
devia ter paciência, pois conheceria o amor do marido no seu leito de núpcias. Então a donzela lhe oferecera o
anel, dizendo: “Já que meus encantos não o seduzem, este anel comprará o seu amor”. E ele sucumbira, pois
era pobre, e a necessidade é o algoz da honra.
Todos se viraram contra a donzela e gritaram: “Rameira! Impura! Diaba!” e exigiram seu
sacrifício.
E o próprio pai da donzela passou a forca para o seu pescoço.
Antes de morrer, a donzela disse para o pescador:
- A sua mentira era maior que a minha. Eles mataram pela minha mentira, e vão matar pela
sua.
Onde está, afinal, a verdade?
O pescador deu de ombros e disse:
- A verdade é que eu achei este anel na barriga de um peixe. Mas quem acreditaria nisso? O
pessoal quer violência e sexo, não histórias de pescador.
VERÍSSIMO, LUIS FERNANDO. AS MENTIRAS QUE OS HOMENS CONTAM. SÃO PAULO: OBJETIVA, ?.

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